Trovadorismo: Cantigas, Sarcasmo e Amores Impossíveis no Século XIII
- campusaraujo
- há 12 horas
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Trovadorismo: O Amor Platônico que Dominou a Idade Média

Chamavam de Trovadorismo. E só o nome já parece som de alaúde afinado com o cotovelo, aquele tilintar torto que anuncia não apenas música, mas toda uma psicologia medieval baseada em suspiros, promessas impossíveis e uma dose cavalar de ingenuidade amorosa.
Foi o primeiro movimento literário da nossa civilização ocidental, ou, pelo menos, o primeiro que juntou poesia, música e um monte de homem suspirando por mulheres casadas, a mais tradicional das tradições europeias.
Começou na Provença, terra de castelos ensolarados e vinhos que provavelmente deixavam os trovadores ainda mais inspirados (ou mais chorões).
Dali se espalhou feito fofoca em corte: uma condessa comentava aqui, um jogral cochichava ali, e logo toda a Europa tava batendo palmas para versos musicados de amores impossíveis. Quando o negócio chegou a Portugal, ganhou o charme rústico do galego-português, língua oficializada por Dom Dinis, o primeiro multitarefa da Península Ibérica, o rei que rimava, cantava, escrevia e ainda encontrava tempo pra governar.
Foi justamente nesse ambiente que surgiu Paio Soares de Taveirós, o autor da famosa Cantiga da Ribeirinha, basicamente um “oi, sumida” do século XII. Só que, em vez de mandado por WhatsApp às 23h47, ele era declamado com alaúde ao fundo, na frente de uma nobre inacessível que, ao que tudo indica, tinha muito mais o que fazer do que ouvir lamentações melódicas de apaixonados profissionais.
O cenário? Um mundo feudal, teocêntrico e, sejamos honestos, bem fedido. A Igreja mandava mais que sogra e regulava tudo: da salvação da alma ao tamanho do sentimento permitido nos poemas. Os trovadores, coitados, andavam por aí com flautas, capas gastas e cara de apaixonados, cantando pra damas inalcançáveis que provavelmente nem sabiam seus nomes. Era amor cortês, amor de joelhos, no sentido literal e figurado, já que boa parte das declarações amorosas incluía uma reverência exagerada, quase um alongamento.
Cantigas de Escárnio e Maldizer no Trovadorismo
Mas não era só melancolia romântica. O Trovadorismo também tinha suas cantigas de escárnio e maldizer, uma espécie de Twitter medieval: indireta aqui, alfinetada ali, muito sarcasmo e crítica social organizada na base do trocadilho. Se alguém estacionava o cavalo na frente da porta errada, virava verso. Se um nobre se achava demais, lá vinha a cantiga expondo a fanfarronice tudo registrado em cancioneiros, esses livros preciosos que funcionavam como diários poéticos da Idade Média.
E o mais curioso é que no meio daquele mundo duro, com peste, cruzadas, fome, duas colheres de superstição por cima e quase nenhuma convivência com o banho, brotava poesia medieval. Poesia afinada, ritmada, organizada, cheia de intenções escondidas. É como se, pra sobreviver à dureza da realidade, o ser humano inventasse a delicadeza como válvula de escape. Vá entender a alma humana.
No século XIV, o Trovadorismo foi murchando, perdendo espaço para o Humanismo, movimento que preferia falar de gente de verdade em vez de amores inalcançáveis. Nada contra os trovadores, eles nos ensinaram que até sofrer pode virar arte e que amor impossível rende boas rimas. Talvez sem eles hoje escrevêssemos apenas e-mails diretos demais pra conter qualquer emoção. Eles nos legaram a noção de que o exagero sentimental também faz parte da história da literatura.
E, convenhamos, se Paio Soares de Taveirós vivesse hoje, estaria no grupo da família mandando um áudio de três minutos, cheio de pausas dramáticas e suspiros calculados:
“Oi, prima da Ribeira… pensei em você ouvindo Marisa Monte. Se não responder, eu componho outra.”


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